quinta-feira, setembro 01, 2011

O maquiavélico plano Franco-Alemão (4)


A escravatura moderna


Nos post anteriores fomos dando pinceladas no quadro da escravatura; vejamos agora como ficou a nossa pintura.

Definimos “escravo” como a pessoa que trabalha a troco da sobrevivência, expurgando a definição de conceitos acessórios como o uso da violência, meros instrumentos para atingir para atingir esse objectivo económico.

Nas latitudes médias, a sobrevivência sempre foi algo que exigiu bastante esforço devido às condições climáticas; por isso não admira que nas grandes civilizações do passado não tenho sido necessário grande violência para fazer as pessoas trabalharem pela sobrevivência – apenas em vez de trabalharem para eles próprios, trabalhavam para outrem. A época dos caçadores-recolectores já tinha terminado, a sobrevivência exigia a agricultura. De certa forma, os humanos da europa já estavam «domesticados», usando uma ideia do Manuel Gouveia.

Já com os africanos ou com os índios a questão foi diferente: a sua sobrevivência não resultava do trabalho agrícola, e ser escravo implicava fazer uma coisa – trabalhar - que não pertencia à sua cultura nem era considerada digna. O uso e abuso da força foi a solução para domar esses humanos.

Com a proibição do uso da violência, a solução para obter escravos foi procurar pessoas abaixo do limiar de sobrevivência e oferecer-lhe esta a troco de trabalho.

Portanto, o método ideal para obter escravos é recorrer a pessoas sem recursos para sobreviverem, pois estas agradecem a possibilidade de serem escravos, no sentido acima definido. Naturalmente que o pagamento nunca pode passar do nível de sobrevivência, pois se isso acontecer as pessoas começam a ter poder reivindicativo e a exigir melhor pagamento; nos processos de escravatura há uma estratégia definida para garantir que isso não acontece.

O desenvolvimento industrial criou uma nova dificuldade: as pessoas tinham de ter recursos para comprar os bens produzidos, logo não podiam ser escravos, tinham de ganhar mais do que o necessário à sobrevivência.

A solução foi ir buscar pessoas a locais onde a sobrevivência não estava garantida. Nascia a Imigração promovida pelos governos.

A necessidade de pressionar o desenvolvimento das sociedades levou à tomada de medidas igualitárias, como o estabelecimento do ordenado mínimo; este tinha de acompanhar o enriquecimento da sociedade, não era o ordenado do escravo. Os imigrantes deixaram de poder ser escravos. Acabou a imigração legal.

Se já não era possível ter escravos no próprio país, a solução teria de ser a deslocalização das fábricas – que teriam de ir para as zonas onde existiam pessoas sem condições de sobrevivência e aí aplicar estratégias que não dessem outra alternativa às pessoas que não fosse trabalhar pela mera sobrevivência.

Esta é uma solução fácil para pequenas empresas e tem sido amplamente utilizada nos países em vias de desenvolvimento; por exemplo, no Brasil, cerca de 20 000 pessoas foram retiradas pelas autoridades, na última década e meia, de esquemas destes; em todo o mundo existem dezenas de milhões de pessoas em trabalho escravo, a grande maioria sendo a consequência directa e necessária duma natalidade descontrolada.

Porém, as grandes fábricas são grandes investimentos e que carecem de uma logística complexa; nas zonas tão atrasadas que não conseguem garantir a sobrevivência da sua população, essas condições não existem normalmente.

Surgiu então uma oportunidade única: mercê de um engenhoso, genial, corajoso sistema económico, com dupla moeda e câmbio gerido internamente, um sistema que o ocidente não parece ter compreendido (ou finge não compreender) e que exporei se tiver oportunidade, a China conseguiu reduzir os custos de produção em moeda ocidental para muito menos de 1/10 – uma redução “artificial” porque decorrente do processo cambial, não representativa do nível de vida que foi assegurado aos chineses.

A China foi um el-dorado para as fábricas; mas um el-dorado a prazo. O projecto da China visa o desenvolvimento da China, os chineses fazem as regras que lhes convêm, (tal como os americanos, os alemães e os ingleses), não andam a reboque dos interesses dos outros.

Assim, por exemplo, a Volkswagen, que tem um enorme investimento na China, teve de formar empresas em que a maioria do capital é chinês e que terminam em 2030. Doutra forma não punha o pé na China.

Esta gestão inteligente dos interesses chineses produziu um enorme desenvolvimento da China que tornou esse sistema de duplo câmbio obsoleto; os ordenados estão a subir rapidamente e os gestores da Volkswagen espremem as meninges à procura de uma maneira de encontrar mão-de-obra ao preço da sobrevivência. Não é fácil, porque todos os países com organização suficiente para suportar uma indústria automóvel visam o seu desenvolvimento, o que significa que os ordenados crescem, e rapidamente se afastam do mínimo de sobrevivência; é o que acontece no Brasil.

Os EUA resolveram este tipo de problema instalando as suas fábricas no norte do México; devido à falta de controlo da natalidade, o México parece ser uma fonte de mão-de-obra ao custo da sobrevivência que tão depressa não se esgotará; ao instalar as suas fábricas junto à fronteira americana, os EUA como que criaram aí uma zona que funciona segundo a sua organização mas dispondo dessa mão-de-obra barata oriunda doutras zonas do México.

Notem que os EUA não estão a explorar os mexicanos; se existem mexicanos dispostos a ser escravos, a responsabilidade é dos próprios mexicanos.

A Europa não tem hipóteses de uma solução deste tipo, pelo menos enquanto as pessoas dos países vizinhos tiverem uma cultura diferente; então como podem as empresas alemãs conseguir mão-de-obra ao preço da sobrevivência, isto é, escravos para as suas fábricas, numa solução em que a situação de escravatura se prolongue no tempo, de forma estável, como acontece com a solução americana?

Agora temos quase todos os elementos para compreendermos a estratégia franco-alemã; só falta uma coisa, aquilo que até as porteiras em França sabem; é isso que veremos no próximo post.


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